A obrigatoriedade do uso do Acordo Ortográfico de Língua Portuguesa,
assinado em 2008 e previsto para entrar em vigor no próximo dia 31,
deverá ser adiada por mais três anos. O Ministério de Relações
Exteriores trabalha atualmente na minuta de um decreto que precisa ser
assinado pela presidente Dilma Rousseff ainda neste mês para adiar o
prazo, caso contrário o acordo entrará em vigor. O novo prazo acordado
pelo MRE, durante reunião de um grupo interministerial composto também
por técnicos do Ministério da Educação e da Casa Civil, é para entrar em
vigor em 1º de janeiro de 2016.
De acordo com a assessoria de
imprensa da Casa Civil, a ministra-chefe Gleisi Hoffmann recebeu em
novembro um grupo de senadores que defenderam o adiamento do prazo, e
convocou uma reunião com os ministérios envolvidos no tema. Uma reunião
com representantes dos ministérios das Relações Exteriores, Cultura e da
Casa Civil, definiu que o acordo vai começar a valer daqui a três anos.
A nova data escolhida pelo grupo, que reúne técnicos e subchefes dos
três ministérios tem como objetivo ajustar o prazo brasileiro com o de
Portugal, que tem mais três anos até que o acordo seja totalmente
aplicado no país.
Segundo o Ministério da Educação, o Brasil é o
que mais avançou na implantação do acordo entre os oito países que
assinaram o documento. Mesmo já tendo feito “a lição de casa”, o
secretário de Educação Básica, César Callegari, explicou ao G1 que o MEC
é favorável a alinhar o cronograma brasileiro “com o cronograma de
outros países, entre eles Portugal”.
Callegari afirmou que, pouco
depois da ratificação do acordo pelo Brasil, o ministério, que é o maior
provedor de livros didáticos do país, começou a incluir, em seus
editais de compra de livros e dicionários para escolas, a exigência de
que os materiais já estejam adaptados às novas regras da ortografia.
Porém, para ele, a preparação dos professores para ensinar as novas
regras cabe às universidades.
“Boa parte da tarefa que cabe ao
ministério está realizada. O trabalho de formação de professores e
atualização cabe fundamentalmente ao sistema de ensino, das instituições
públicas e privadas de educação superior. Mas as diretrizes estão
dadas, e os materiais já estão com as novas características dessa nova
ortografia”, disse.
O MRE afirmou, por meio de sua assessoria, que
seus técnicos ficaram responsáveis por minutar o decreto até o fim do
mês, para que ele possa ser submetido à Presidência da República. Mas,
segundo o ministério, novo prazo será definido pela própria presidente. A
ideia, de acordo com o MRE, é prorrogar a entrada em vigor do acordo
para dar mais tempo de adaptação das pessoas à nova ortografia.
Pedagogia defasada
Mas a data de implantação do acordo não é a única preocupação de alguns políticos e membros da sociedade civil. Senadores que integram a Comissão de Educação, Cultura e Esporte acreditam que parte da dificuldade de adesão dos brasileiros às novas regras é culpa da falta de debate em torno do tema.
De acordo com a assessoria de imprensa
do presidente da comissão, Roberto Requião (PMDB-PR), o senador “vê com
reservas” o conteúdo do acordo porque ele foi articulado pelos
governos, mas não ganhou espaço de discussão na socidade. Os senadores
tinham o objetivo de elaborar um projeto de lei para adiar a implantação
do documento, mas, em conversas com os ministérios, decidiu-se que a
melhor abordagem seria por meio de um decreto.
Em entrevista à
Rádio ONU, a senadora Ana Amélia (PP-RS), que também integra a comissão
e, segundo sua assessoria, é autora do projeto, afirmou que a proposta
de adiar o prazo é um “gesto de solidariedade” e de “boa vontade
política”. Já a ideia de substituir o projeto de lei por um decreto
presidencial serve para “facilitar do ponto de vista legislativo. Um
projeto de resolução criaria alguns problemas de ordem legal em função
de ser um acordo internacional”.
Um dos maiores críticos do acordo
no país quer aproveitar o possível adiamento para mudar o conteúdo da
nova ortografia. Segundo o professor Ernani Pimentel, presidente da
Editora Vestcom e do Movimento Acordar Melhor, é preciso simplificar as
novas regras e “ajustar problemas que não foram percebidos” pelas
pessoas responsáveis pela elaboração e assinatura do documento.
Para
ele, como a implantação do acordo avançou menos nos demais países e tem
recebido críticas por lá, e como o Brasil deve adiar a entrada em vigor
das nossas regras por mais três anos, o momento é oportuno para
corrigir as principais questões.
O mais sério dos problemas,
segundo ele, é o fato de o acordo ter sido pensado na década de 1970,
quando o sistema educacional era muito diferente do atual. “Naquela
época a educação se baseada na didática da memorização, na chamada
‘decoreba’. Em história, o que se estudava história eram nomes e datas, e
em português eram só as regras e as exceções. Mas a pedagogia foi
evoluindo, e hoje o aluno está acostumado a racionar, ele quer pensar e
entender, e não ficar decorando, e essas regras são baseadas ainda na
pedagogia antiga”, afirmou Pimentel ao G1.
Segundo Callegari, do
MEC, as propostas de simplificação não estão contempladas na discussão
do grupo interministerial. “O que poderia ser considerado e sempre pode
ser considerado são propostas que visam simplificar, mas não seria
adiar, seria outro acordo”.
Muitas regras
O especialista explica que, com tantas regras no idioma atual, e a falta de conhecimento a respeito das mudanças acordadas, é impossível falar português fluentemente. Desde 2008, ele já colheu mais de 20 mil assinaturas de brasileiros contra a implantação da nova ortografia.
Mais
da metade, segundo Pimentel, é formada por professores, muitos deles
ainda sem familiaridade com a nova ortografia e contrários à forma como o
acordo foi feito, sem o devido debate nas escolas, universidades e na
sociedade em geral.
“Você não pode fazer um acordo de ortografia
sem ver o que os professores acham. Se os professores não aprenderem [as
novas regras], eles não podem ensinar”, afirmou o especialista. Ele
afirma que os professores calculam gastar 400 horas de aula ao ensino da
ortografia no ciclo básico e, mesmo assim, os brasileiros saem da
escola sem dominar as regras. A simplificação, nesse caso, auxiliaria a
melhorar a qualidade da educação. ”Essas regras são ilógicas, não pode
impor na sociedade.”
Fonte: Portal Aprendiz.
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