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domingo, 14 de agosto de 2016

Queremos uma educação voltada para o mercado ou para a inclusão?



Todos nós sabemos que, apesar da complexidade dos desafios enfrentados pelo Brasil, determinados argumentos parecem ser compartilhados. Um deles diz respeito ao papel da educação na construção de um país mais igualitário. Em linhas gerais, acredita-se que a redução das desigualdades econômicas e sociais é diretamente dependente da garantia, a qualquer brasileiro, de acesso a uma educação de qualidade.

Essa constatação nos leva a uma pergunta que deveria estar presente na pauta dos gestores públicos que usufruem do poder de decidir sobre os rumos a serem tomados pela educação de nosso país: que tipo de educação precisamos?

Nos últimos anos, tenho viajado para diversas regiões do mundo em busca de experiências consistentes de educação inclusiva. Com esse objetivo, tive a oportunidade de visitar escolas que se destacam por implementar propostas pedagógicas orientadas não só pelo desempenho escolar mas também pelo acolhimento das diferenças humanas. Além de entrevistar professores e diretores dessas instituições, sempre me aproximo dos gestores públicos responsáveis pela educação da respectiva cidade ou do país.

Ao perguntá-los sobre o tipo de educação que almejam, observo a existência de uma aparente dicotomia entre duas vertentes: uma que é defensora da meritocracia e do desenvolvimento de competências cognitivas voltadas às demandas tradicionais do mercado de trabalho; outra que é comprometida com a igualdade de direitos e é pautada pelo desenvolvimento de competências socioemocionais e pela construção de uma sociedade inclusiva. Em outras palavras, parece haver uma tensão binária entre a educação para o mercado e a educação para a cidadania.


Tenho refletido muito sobre essa suposta dicotomia, e acredito que seja resultado de uma falta de visão. Sejam quais forem os referenciais políticos e ideológicos que nos guiam, todos somos conscientes da amplitude de demandas que nos impactam a cada instante. Somos chamados a planejar, calcular, analisar, estruturar e persuadir, e, ao mesmo tempo, somos convocados a ponderar, tolerar, respeitar, ressignificar e ceder.

Não se trata, portanto, de escolher entre: competitividade ou cidadania; meritocracia ou tolerância; competências cognitivas ou competências socioemocionais. Trata-se de assumirmos a necessidade de uma visão mais ambiciosa de sociedade e, consequentemente, de educação.

Há alguns anos, tive a chance de conversar com Pirjo Koivula, integrante do Ministério da Educação da Finlândia –país que tem se destacado em rankings internacionais sobre qualidade de ensino. Ao perguntá-la sobre como conciliar a busca por desempenho acadêmico com o acolhimento das diferenças, Pirjo explicou que a Finlândia investe continuamente em suporte ao aluno.

Seja qual for o background, todo aluno em algum momento pode precisar de atenção individualizada e os professores são orientados a identificar diariamente aqueles que precisam de apoio. Pessoas com deficiência fazem parte desse processo e acabam sendo tratadas como iguais, pois, assim como as outras, uma criança com deficiência pode precisar de "suporte" e é isso que buscam oferecer. Outra evidência de que tal abordagem não é discriminatória é a opção por abandonar a expressão "educação especial".

Uma fonte notável de ideias para um educação inclusiva é o professor Thomas Hehir, membro da Harvard Graduate School of Education. Segundo ele, os docentes precisam ter em mente as diversas necessidades e os desafios que os estudantes podem enfrentar. Por exemplo, um aluno disléxico ou um que sofra de ansiedade podem se sentir constrangidos quando chamados para uma leitura oral em classe.

É papel do professor conhecer a história de cada aluno e evitar esse tipo de situação. Ao mesmo tempo, Hehir argumenta que todos os estudantes podem se beneficiar de estratégias de ensino que são criadas a partir de um conceito de desenho universal de aprendizagem. É o caso das pessoas que preferem utilizar tecnologias que transformam textos escritos em textos falados, em vez de utilizarem a leitura convencional. Esse é um recurso normalmente adotado por pessoas cegas, mas que pode ser útil para todos.

Voltando à nossa reflexão inicial, nenhuma das referências aqui citadas rendeu-se à dicotomia entre educação para o mercado versus educação para a cidadania. Mais do que isso, indicaram que é possível transcender a armadilha da escolha simplista entre dois extremos e perseguir uma educação baseada na soma.

Sob outro ponto de vista, assumo a crença de que a educação que precisamos não deve se contentar com a formação de pessoas que se limitam a seguir as regras do jogo e a enxergar o mundo tal como o herdamos. Precisamos buscar um tipo de educação que nutra o desenvolvimento de cidadãos críticos e incomodados. Isso implica considerarmos a formação de seres humanos capazes de romper com visões dicotômicas e de interferir positivamente na complexa tessitura de uma sociedade coesa e igualitária.




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