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sexta-feira, 19 de outubro de 2018

ARTIGO: Formação de professores e a EaD


Foto: Pexels

GABRIEL GRABOWSKI 

COLUNISTA 


[..]. a responsabilidade ética, política e profissional do ensinante lhe coloca o dever de se preparar, de se capacitar, de se formar antes mesmo de iniciar sua atividade docente. Esta atividade exige que sua preparação, sua capacitação, sua formação se tornem processos permanentes. Sua experiência docente, se bem percebida e bem vivida, vai deixando claro que ela requer uma formação permanente do ensinante. Formação que se funda na análise crítica de sua prática (FREIRE, 1993).

O Censo da Educação Superior 2017, divulgado recentemente pelo Inep/MEC, confirma a tendência da expansão da educação superior na modalidade a distância nos termos do Decreto nº 9.057/2017, editado em 2017, flexibilizando e facilitando a oferta sem garantia de padrão de qualidade e sem mecanismos de fiscalização.

Em 2007, a modalidade a distância representava 7,0% das matrículas de graduação. Em 2017, a EaD aumentou 17,6% e já atende mais de 1,7 milhão de alunos, o que representa uma participação de 21,2% dos alunos de graduação no país, enquanto a modalidade presencial apresenta o segundo ano de queda no número de matrículas. Em dez anos, o crescimento dos ingressantes em EaD foi de 226%, contra 19% da modalidade presencial. A rede privada, que conta com mais de 6,2 milhões de alunos (75.3%), é a maior ofertante da educação na EaD.

Essa expansão da EaD está concentrada em dois graus acadêmicos: Cursos Superiores de Tecnologia (Tecnólogos) e Cursos de Licenciaturas. Os cursos tecnológicos aumentaram em 5,6% em 2017, fenômeno ocasionado, principalmente, pela variação positiva registrada na modalidade EaD. No período de 2007 a 2017 o número de matrículas em cursos de graduação tecnológicos cresceu mais de 140%. Oito em cada dez alunos de cursos tecnológicos frequentam a rede privada e mais da metade dos ingressantes estuda a distância. A rede pública tem pouco mais de 160 mil alunos. Com uma participação de 51,7%, os governos estaduais dividem com a União (46,7%) o atendimento desses alunos. Diferente da rede privada, na rede pública a maior parte dos alunos estuda em cursos presenciais.

Os cursos de licenciaturas – formação de professores – têm 1.589.440 alunos matriculados em 2017, o que representa 19,3% do total de alunos na educação superior do Brasil. Em 2017, a matrícula na modalidade a distância manteve sua tendência de crescimento, atingindo 46,8%, enquanto a modalidade presencial tem praticamente o mesmo número de alunos de 2007, 53,2% das matrículas. A maioria dos alunos dos cursos de licenciatura é do sexo feminino (70,6%) e estuda em uma instituição de ensino superior privada, diferentemente dos estudantes de licenciatura de instituições públicas, que frequenta cursos presenciais (81,7%). Na rede privada, prevalecem os cursos a distância, com quase 65% dos alunos.

Essa configuração na oferta dos cursos de licenciaturas no Brasil já causa impactos não somente na falta de professores, mas, fundamentalmente, na qualidade da formação dos docentes. É importante destacar que não é a EaD, em si, a causa das consequências negativas e imprevisíveis, mas o conjunto da política de formação e carreira docente que transcorrem em cursos acelerados, instituições privadas sem investimentos em pesquisa, com pouca inserção na realidade local e regional e, predominantemente, com oferta na modalidade a distância prematura e de qualidade duvidosa.

Segundo António Nóvoa e Pâmela Vieira, a questão central da formação de professores, em todo o mundo, prende-se com a relação entre a formação e a profissão. Não se trata de insistir na ligação entre a teoria (que estaria nas universidades) e a prática (que estaria nas escolas). Essa dicotomia é pobre e estéril. Trata-se, isso sim, de compreender o modo como a formação deve estar ligada à profissão, e vice-versa. No caso da formação inicial, que deve ser da responsabilidade da universidade, é necessário assegurar uma maior presença dos professores e das culturas profissionais docentes, bem como um maior diálogo com as realidades escolares e sociais. Às universidades atribui-se uma capacidade de conhecimento cultural e científico, intelectual, de proximidade com a pesquisa e com o pensamento crítico. Mas esquecemo-nos de que, por vezes, é apenas um conhecimento vazio, sem capacidade de interrogação e de criação.

O desenvolvimento profissional abrange todo o ciclo de vida docente, desde a formação inicial até a aposentadoria. Traduz uma ideia central para pensar os professores e a sua formação. Trata-se de compreender como se constrói uma identidade que é, ao mesmo tempo, individual e coletiva, desde o primeiro dia como estudante de uma licenciatura. É necessário recusar o consumismo de cursos, seminários e ações que caracterizam o atual “mercado da formação”, sempre alimentado por um sentimento de “desatualização” dos professores. A única saída possível, segundo Nóvoa, é o investimento na construção de redes de trabalho e de práticas de formação baseadas na partilha e no diálogo profissional. As experiências mais interessantes estão localizadas nas escolas, em torno de projetos que são, ao mesmo tempo, de inovação pedagógica e de formação docente.

É nesta mesma perspectiva que Paulo Freire condiciona a melhoria da qualidade da educação à formação permanente dos educadores e essa formação se funda no exercício de analisar a prática de ensino. Por isso, na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando a prática de hoje, ou de ontem, que se pode melhorar os próximos fazeres.

É necessária uma compreensão de que a “escola é lugar de gente, lugar onde se faz amigos, […] gente que trabalha, que estuda, que se alegra, se conhece, se estima. […] e a escola será cada vez melhor na medida em que cada um se comporte como colega, amigo, irmão. [..] nada de ser como o tijolo que forma a parede, indiferente, frio, só. […] numa escola assim vai ser fácil estudar, trabalhar, crescer, fazer amigos, educar-se, ser feliz” (Freire).  É essa escola que precisamos construir, uma escola real, viva, humana, capaz de compreender os desafios de seu tempo, e na luta pelo melhor viver, reconhecer fatos, gestos, unir conhecimentos – comprometida com as gerações atuais e futuras.

Outras questões e interrogações permanecem abertas para nossa reflexão e para o debate que precisa continuar, tais como: Terão os professores formação para vislumbrar a necessária ampliação, construção e (re)construção de novos saberes? Estarão preparados para olhar além dos muros da escola, para aproveitar e explorar o conhecimento que o aluno traz consigo, o de que vem em busca? Conseguirão visualizar um futuro próximo, em que seus alunos irão atuar e, com base nisto, dar-lhes condições de inserção no mercado de trabalho? E serão capazes de fazer isto tudo levando em consideração que as tecnologias da comunicação e da informação estão cada vez mais presentes no nosso quotidiano e, por conseguinte, devem, de alguma forma, ser garantidas no processo ensino-aprendizagem? (Ligia Magalhães, UFRJ).



Fonte: https://www.extraclasse.org.br/exclusivoweb/2018/10/formacao-de-professores-e-a-ead/?fbclid=IwAR1nOwNTrQ7BEZnsRO807B2kVmz7D2DxHvndBsalOj6ykCS9rmEBer8A7YM

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