Um estudo realizado pelo Centro de Estudos da Metrópole (CEM) em
parceria com o Ministério das Cidades mapeou a evolução, ao longo da
década de 2000, dos instrumentos de gestão de políticas públicas de
habitação presentes nos municípios brasileiros.
Os resultados do
trabalho foram sintetizados no livro Capacidades Administrativas dos
Municípios Brasileiros para a Política Habitacional, lançado nesta
quinta-feira (19/7) durante um seminário sobre o tema, em São Paulo. A
partir do dia 23 de julho, a obra estará disponibilizada gratuitamente
no site do CEM – um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (CEPID)
da FAPESP.
O estudo, coordenado pela diretora do CEM, Marta
Arretche, que é professora do Departamento de Ciência Política da
Universidade de São Paulo (USP), foi realizado com base em dados da
Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
De acordo com
Arretche, o trabalho demonstra que a instituição do Sistema Nacional de
Habitação de Interesse Social (SNHIS), em 2005, induziu os municípios à
criação de importantes instrumentos de gestão de políticas públicas
habitacionais.
O sistema de habitação brasileiro, segundo ela,
pressupõe a existência de estruturas administrativas funcionando em
coordenação nos três níveis de governo. Mas a heterogeneidade dos
municípios é muito grande e por isso esse sistema tem uma engenharia
extremamente complexa.
“O estudo procurou mapear a evolução desse
sistema ao longo da década e demonstrou que a coordenação federal se
tornou mais efetiva depois de 2005. Foi possível também confirmar a
importância de um sistema nacional que dê sustentação às políticas
municipais”, disse Arretche à Agência Fapesp.
Segundo ela, o
estudo mapeou a existência, nos municípios brasileiros, de instrumentos
importantes para as políticas públicas de habitação, como os cadastros
feitos para identificar o déficit municipal de moradia, os conselhos e
fundos municipais de habitação e a existência de órgãos habitacionais
como secretarias específicas, ou setores dedicados ao assunto em outras
secretarias. Para isso, o CEM desenvolveu uma metodologia especial.
“Temos
municípios com populações que vão de 800 até 11 milhões de habitantes e
um imenso número de municípios médios muito diversificados. Os
instrumentos de gestão existentes variam tanto como a imensa gama de
problemas habitacionais. A novidade da metodologia consiste em tentar
captar essa diversidade, possibilitando comparações entre os municípios
da situação de cada município com ele mesmo ao longo do tempo”,
explicou.
Cerca de um terço dos municípios não possuem nenhuma
estrutura para gestão de políticas públicas habitacionais, segundo o
estudo. Uma minoria de aproximadamente 4% dos municípios têm uma
secretaria exclusivamente dedicada à habitação.
“A existência de
uma burocracia municipal especializada, embora não baste, é uma condição
fundamental para que se possa fazer políticas públicas habitacionais
nas cidades”, afirmou Arretche.
Segundo Arretche, o instrumento de
políticas habitacionais mais disseminado entre os municípios é o
cadastro que permite aos gestores diagnosticar se existem famílias com
necessidades habitacionais. “Em 2004, mais de 73% dos municípios tinham
esse recurso. Em 2009, o instrumento já existia em mais de 80% dos
municípios”, disse.
Cerca de dois terços dos municípios
brasileiros contavam, no fim da década, com algum órgão para a gestão da
política habitacional, segundo a pesquisa. Os instrumentos que mais
ganharam espaço nos municípios brasileiros entre 2003 e 2009 foram os
conselhos e fundos municipais.
“No início da década, só 14% dos
municípios tinham conselhos e 7,4% deles tinham fundos habitacionais. No
fim da década, aproximadamente 43% dos municípios contavam com um
conselho ou um fundo municipal de habitação”, disse.
A decisão dos
municípios de instalar um órgão gestor da política habitacional varia
extremamente em relação ao tamanho de cada um deles, segundo a pesquisa.
“A ausência de um órgão de gestão é um fenômeno concentrado nos
municípios pequenos, de até 20 mil habitantes da região Sudeste –
provavelmente porque eles já contam com políticas estaduais e não querem
usar recursos para implantar essas estruturas”, afirmou.
A “morte
institucional” do órgão – categoria adotada para designar a situação em
que o governo municipal decide fechar uma secretaria ou departamento de
habitação – está fortemente associada à região geográfica, segundo o
estudo. “A morte institucional é mais recorrente nas regiões Norte e
Centro-Oeste e nos municípios do Nordeste fora de Regiões
Metropolitanas”, disse Arretche.
Os municípios pequenos têm menor
presença de órgãos de gestão da política habitacional, que estão
presentes com alta frequência nos municípios de porte grande e médio e
mais urbanizados. Por outro lado, a ausência de conselhos municipais de
habitação está concentrada em municípios das regiões Norte e Nordeste,
com até 20 mil habitantes e pouco urbanizados.
O estudo também
mapeou os principais tipos de programas habitacionais implementados
pelos municípios. A opção mais frequente foi a construção de unidades
habitacionais: 61% dos municípios brasileiros implementaram programas de
construção de moradias em 2007-2008. “Quanto à cooperação
intergorvernamental, 41% do total de municípios implementaram seus
programas em cooperação com o governo federal, enquanto 29% deles
cooperaram com os estados”, afirmou Arretche.
A melhoria de
unidades habitacionais (47%), a oferta de material de construção (36%) e
a oferta de lotes (25%) foram as categorias de programas mais adotadas
pelos municípios no biênio 2007-2008. A categoria menos utilizada foi a
de urbanização de assentamentos, com 14% do total.
Rigor metodológico
Segundo
a Diretora do Departamento de Desenvolvimento Institucional e
Cooperação Técnica do Ministério das Cidades, Junia Santa Rosa, o grande
mérito do trabalho é o rigor metodológico e conceitual garantido pela
participação do CEM.
“Raras vezes encontramos essa profundidade em
um trabalho sobre a questão urbana e habitacional. É fundamental trazer
um conjunto de ferramentas e instrumentos de análises estatísticas e
econométricas para lidar com esse tema”, disse.
Segundo Santa
Rosa, o trabalho demonstra que o sistema nacional é fundamental para
induzir à criação dos instrumentos nos municípios. “O sistema nacional
de habitação está cumprindo esse papel indutor. Confirmar isso é
essencial para melhorar as políticas nacionais”, afirmou.
A
existência desses instrumentos nos municípios, segundo Santa Rosa, não
soluciona por si só os problemas de habitação, mas ainda assim é
fundamental. “Ter um sistema nacional e implementar fundos, planos e
conselhos nas cidades não são condições suficientes, mas são condições
necessárias para que o município possa gerir sues projetos”, declarou.
Fonte: Agência Fapesp.
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