quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Vitória da Contee: Lei da Mordaça é inconstitucional



A imprensa nacional — como o jornal Folha de S.Paulo fez em (22 de outubro) em seu editorial — tem dado destaque ao parecer do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), em que considerou inconstitucional a legislação do estado de Alagoas patrocinada pelo movimento Escola Sem Partido. Trata-se de uma grande vitória da Contee, que, no dia 30 de maio deste ano, ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no STF solicitando a suspensão imediata da lei, conforme afirma o próprio parecer.

No texto enviado pela Contee ao STF, a entidade já apontava que “tal lei é contrária aos princípios da Constituição Federal que prevê, dentre outras coisas, liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino, e gestão democrática do ensino público, na forma da lei”.

A ADI, sob o número 5537, indicou também que a lei afronta os principais tratados internacionais, dos quais o Brasil é signatário, tais como a Declaração Universal dos Direitos Humanos, o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto de San José da Costa Rica (leia aqui a ação completa).

“O projeto é inconstitucional e viola diretamente os direitos fundamentais, individuais e sociais dos professores e professoras. Há vários meses a Contee vem se manifestando contra projetos e atitudes que buscam cercear a atuação dos educadores nas salas da aula e não vai ser calar”, criticou, na ocasião, a atual coordenadora da Secretaria-Geral da Contee, Madalena Guasco Peixoto, que respondia então pela Coordenação-Geral da Confederação. Neste sábado, 22 de outubro, Madalena comentou o parecer da PGR e o editorial da Folha, destacando “o protagonismo da Contee nestes momentos difíceis”. Vale frisar que a Confederação lançou inclusive uma campanha nacional contra a Lei da Mordaça.

Em seu parecer, Janot destaca que a “lei alagoana restringe o conteúdo da liberdade constitucional de ensino, pois suprime manifestação e discussão de tópicos inteiros da vida social, quando proíbe o docente de ‘introduzir, em disciplina ou atividade obrigatória, conteúdos que possam estar em conflito com as convicções morais, religiosas ou ideológicas dos estudantes ou de seus pais ou responsáveis’.”. Ele acrescenta ainda que existem “equívocos conceituais graves na norma, como o de considerar que o alunado seria composto de indivíduos prontos a absorver de forma total, passiva e acrítica quaisquer concepções ideológicas, religiosas, éticas e de outra natureza que os professores desejassem. Despreza a capacidade reflexiva dos alunos, como se eles fossem apenas sujeitos passivos do processo de aprendizagem, e a interação de pais e responsáveis, como se não influenciassem a formação de consciência dos estudantes”.

O procurador-geral da República também enfatiza que ao “pretender cercear a discussão no ambiente escolar, a Lei 7.800/2016 de Alagoas contraria princípios conformadores da educação brasileira, em especial as liberdades constitucionais de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; o pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas e a gestão democrática do ensino público. Afronta, portanto, o art. 206, II, III e VI, da Constituição da República”.

Inconformismo com as conquistas sociais

Em nota técnica divulgada no dia 21 de julho, a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, também já havia apontado que “é preciso desmascarar o compromisso aparente que tanto o PL como o ESP [Escola Sem Partido] têm com essa principiologia constitucional. A começar pelo uso equivocado de uma expressão que, em si, é absurda: ‘neutralidade ideológica’. A definição modernamente mais aceita de ideologia, de Jonh B. Thompson, são ‘os modos pelos quais o significado (ou a significação) contribui para manter as relações de dominação’. Um poder dominante pode legitimar-se envolvendo pelo menos seis estratégias diferentes: promovendo crenças e valores compatíveis com ele; naturalizando e universalizando tais crenças de modo a torná-las óbvias e aparentemente inevitáveis; desqualificando ideias que possam desafiá-lo; excluindo formas rivais de pensamento; e obscurecendo a realidade social de modo a favorecê-lo. De modo que não há, ontologicamente, ideologia neutra. (…) O que se revela, portanto, no PL e no seu documento inspirador é o inconformismo com a vitória das diversas lutas emancipatórias no processo constituinte; com a formatação de uma sociedade que tem que estar aberta a múltiplas e diferentes visões de mundo; com o fato de a escola ser um lugar estratégico para a emancipação política e para o fim das ideologias sexistas – que condenam a mulher a uma posição naturalmente inferior, racistas – que representam os não-brancos como os selvagens perpétuos, religiosas – que apresentam o mundo como a criação dos deuses, e de tantas outras que pretendem fulminar as versões contrastantes das verdades que pregam”.

No documento, a procuradora ainda concluiu enfatizando que “o PL está na contramão dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, especialmente os de ‘construir uma sociedade livre, justa e solidária’ e de ‘promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação’.”



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