terça-feira, 20 de setembro de 2016

MANIFESTO: A Proteção Que Queremos





“Muito antes da castração química, do armamento da população, de penas mais severas para os agressores, queremos ser ouvidas”, diz o manifesto A Proteção que Queremos, divulgada pelo Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes, Artemis, Childhood Brasil e Think Olga.




A Proteção Que Queremos

Uma vítima de estupro hoje tem muito pouca ou quase nenhuma chance de ver seu agressor ser punido pelo o que fez. Seja pela vergonha erroneamente direcionada à vítima que a impede de fazer uma denúncia ou pela notável inabilidade da polícia e do judiciário em lidar com crimes dessa natureza.

As convicções pessoais de agentes públicos têm sido a principal barreira enfrentada pelas corajosas vítimas que decidem reportar o crime. Quando não capacitados para a escuta protegida, investigadores e delegados tomados de preconceitos e já descrentes da versão que ouvem, mesmo antes de qualquer averiguação, são os primeiros de muitos escudos concedidos aos criminosos por órgãos de governo e justiça.

É urgente e necessário que haja um protocolo único de âmbito nacional para o atendimento integrado das vítimas de crimes sexuais. Protocolo este que considere uma escuta qualificada, realizada por profissionais treinados para lidar com esse tipo de trauma; tratamento médico e exames de corpo de delito que independam das crenças do profissional de saúde sobre o caso; conselho tutelar e escola, quando for o caso, que acolham e protejam a criança e adolescente nesse momento difícil.

Muito antes da castração química, do armamento da população, de penas mais severas para os agressores, queremos ser ouvidas. A nós pouco importam mudanças nas punições dos nossos algozes. Mais do que tudo é preciso dar ouvidos à nossa história, com uma escuta qualificada, pois somente assim eles chegarão a ser responsabilizados. 

Mas não com descaso, com machismo, desconfiando da veracidade antes de apurar os fatos. Sem que nesse momento eu sinta como se precisasse me defender da própria polícia. Quero privacidade, seriedade, respeito. Na maioria das vezes, sou apenas uma menina e quem violou o meu corpo é um parente que traiu também a minha confiança. E a única testemunha sou eu mesma.

Quero contar a minha história uma só vez e levar crédito. Se vim até aqui, não quero ser convencida a voltar atrás. Não quero reviver essas memórias várias outras vezes, na frente de desconhecidos e até do meu agressor. Não quero precisar contar detalhes para o médico, para o conselho tutelar e para todo mundo que quer vestir o chapéu de investigador e tomar o martelo do juiz.

Queremos a proteção do estado sobre as vítimas que encontraram dentro de si a coragem para fazer a denúncia. Isso, por si só, já é raro, já é uma vitória. Que não sejam as delegacias, os profissionais de saúde, os conselheiros tutelares e demais envolvidos no tratamento dessa vítima a extensão do seu pesadelo, mas a esperança de um recomeço.

Think Olga
Childhood
Comitê Nacional de Enfrentamento à Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes
Artemis

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