Discutir as pesquisas no campo da comunicação, com
um balanço dos temas mais estudados, e apresentar um panorama dos
projetos apoiados pela Fapesp na área nos últimos dez anos.
Com
esse propósito, o “Seminário Intercom – Fapesp Caminhos Cruzados:
Comunicar para Conhecer” reuniu, no dia 12 de novembro, em São Paulo,
alguns dos principais pesquisadores da área no Brasil, que apresentaram
ao público um balanço das pesquisas realizadas em diferentes vertentes
da comunicação.
O seminário, organizado pela Sociedade Brasileira
de Estudos Interdisciplinares em Comunicação (Intercom), fez parte de
uma série de encontros que estão sendo realizados pela instituição em
2012, ano em que completa 35 anos. A série homenageia instituições como a
Fapesp, que faz 50 anos. Durante o encontro foi apresentado um panorama
das pesquisas conduzidas em diferentes áreas da comunicação, das quais
363 contaram com apoio da FAPESP na última década.
O seminário foi
aberto por Maria Immacolata Vassallo de Lopes, professora e
coordenadora do Centro de Estudos de Telenovela (CETVN) da Escola de
Comunicações e Artes (ECA) da Universidade de São Paulo (USP), que
apresentou um balanço das pesquisas desenvolvidas no Centro envolvendo
estudos televisivos e o gênero ficcional dentro da TV, com ênfase para a
produção de teledramaturgia brasileira, mais especificamente a
telenovela, como fenômeno cultural de massa.
A trajetória das
pesquisas que deram origem ao CETVN, apresentada por ela, ressalta a
dificuldade enfrentada pelos pesquisadores do tema em estabelecer
legitimidade à telenovela como objeto de estudo, e faz sobressair o
patamar atual das pesquisas na área, que colocam o Brasil em destaque
entre os 12 países que compõem o Observatório Ibero-americano de Ficção
Televisiva (Obitel) – uma rede virtual de pesquisadores de
teledramaturgia, com protocolo de pesquisa unificado, acompanhamento das
produções televisivas e publicação periódica de artigos.
Nessa
trajetória, Maria Immacolata destacou as primeiras pesquisas de recepção
da telenovela, quando ainda se buscava estabelecer uma metodologia de
pesquisa para a área, passando pela telenovela como recurso narrativo e
como narrativa da própria nação, até os estudos atuais, “em que o
fenômeno do conteúdo televisivo e da participação do público nas redes
sociais na internet configura a chamada transmidiação, integrando novas
possibilidades de estudo, como a ‘netnografia’”.
As pesquisas
sobre televisão, que ganharam vulto na última década, também foram
destaque na apresentação de Esther Império Hamburger, diretora do Cinusp
Paulo Emílio.
De acordo com Hamburger, há atualmente uma
diversificação dos meios televisivos e, consequentemente, das pesquisas
envolvendo esse meio, visto que os projetos abordam desde aspectos da
indústria cultural, passando pela história da televisão, pela pesquisa
sobre digitalização de acervos e chega às inovações tecnológicas, que,
conforme disse, são antecipadas pela imaginação.
Segundo a
pesquisadora – que também coordena o Laboratório de Investigação e
Crítica Audiovisual (Laica) da ECA-USP, apoiado pelo Programa
Equipamentos Multiusuários da Fapesp –, enquanto inovações tecnológicas
como videoteipe, satélite, cor e transmissão por cabo não alteraram
conceitualmente a televisão, adventos tecnológicos mais recentes, como a
TV digital e a convergência com a internet, vêm transformando
significativamente o conceito desse meio, abolindo por completo a ideia
unidirecional da informação.
“Entre outros aspectos, essas
inovações desconstruiram a noção de grade de programação, permitindo que
o telespectador tenha acesso hoje não apenas ao conteúdo exibido, mas
seja ele mesmo um agente da programação”, disse Hamburger.
Novas mídias e participação pública
As
apresentações da manhã no Simpósio Intercom tiveram como moderadora
Mariluce Moura, diretora de redação da revista Pesquisa Fapesp. Na parte
da tarde, Maria da Graça Mascarenhas, gerente de comunicação da
Fundação, foi responsável pela moderação das conferências, iniciadas por
Lúcia Santaella, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em
Tecnologias da Inteligência e Design Digital da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC-SP).
Os estudos envolvendo as chamadas
novas mídias e suas confluências com a televisão foram o mote da
exposição de Santaella. Segundo a pesquisadora, essa mescla, que levou à
hipermídia, também transformou a internet em “plataformas
participativas, nas quais a navegação livre acontece concomitantemente
às possibilidades oferecidas pelos novos direcionamentos propostos pelas
redes sociais, a partir das quais há uma maior ordenação dos sentidos”.
Santaella
também fez uma análise das subáreas apoiadas pela FAPESP no campo da
comunicação desde 2002, elencando pesquisas em temas como visualidade na
realidade urbana; o universo da imagem (das imagens mentais às fotos e
imagens digitais); imagem e arte; relações entre design e arte;
publicidade e consumo; cinema e audiovisual; mídia e comunicação;
multimídia e hipermídia; cibercultura; redes digitais; ativismo nas
redes e inclusão digital; ambientes e plataformas digitais e games.
Um
aspecto importante observado por Santaella é que as pesquisas em
comunicação, antes restritas a instituições mais tradicionais, foram se
espraiando ao longo da última década e, atualmente, estudos são
conduzidos nas mais diferentes universidades e instituições de pesquisa,
com apoio de agências de fomento, como a Fapesp. O mesmo ocorreu com
subáreas antes tidas como irrelevantes, como os games, que hoje são
encaradas como um novo aspecto a ser explorado também pelos
pesquisadores.
Outra análise, desta vez sobre estudos em
comunicação científica, foi apresentada por Carlos Vogt, coordenador do
Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo (Labjor) da Universidade
Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade Virtual do Estado de
São Paulo (Univesp).
Além de expor um panorama das pesquisas
realizadas pelo Labjor sobre comunicação científica, envolvendo
percepção pública da ciência e da tecnologia, relações entre técnica e
tecnologia e aspectos da cultura científica, Vogt destacou a questão dos
modelos de percepção e o combate ao conceito de déficit de compreensão –
o qual pressupõe haver certa hierarquia na construção do conhecimento
científico e na maneira como essas informações chegam ao público.
“Ao
contrário dessa noção de déficit de conhecimento, a cultura científica
pode ser compreendida na forma de uma espiral, na qual todos os atores
da construção do conhecimento científico tomam parte, inclusive o
público”, disse Vogt.
O pesquisador, que também é poeta e
linguista, exemplifica a questão por meio de analogia: o fato de uma
pessoa não jogar futebol não a impede de amá-lo, de ser amador de sua
prática, e de praticá-lo sempre, mesmo que, na maioria das vezes apenas
pela admiração aficionada de torcedor. O mesmo ocorreria com o
conhecimento e a cultura científica.
Nesse sentido, o conceito de
bem estar cultural, resultante das relações da sociedade com as
inovações tecnológicas e que envolve valores e atitudes, hábitos e
informações, se caracterizaria, segundo Vogt, pelo conforto crítico da
inquietude gerada pela provocação sistemática do conhecimento – fator
preponderante também para as pesquisas na área da comunicação.
Comunicação básica
Embora
complexo, o problema da pesquisa em comunicação, para o professor José
Marques de Melo, presidente honorário e um dos fundadores da Intercom,
pode ser mais facilmente localizado, hoje, na desigualdade que verifica
nas próprias pesquisas desse campo.
Segundo Melo, enquanto as
investigações avançam em termos de novas mídias, o conhecimento acerca
das questões fundamentais da comunicação tem sido deixado de lado pelos
jovens pesquisadores da área.
“As novas tecnologias não alteram
significativamente a área da comunicação. Elas são absorvidas pelas
sociedades, mas têm capacidade limitada para modificações conceituais.
No Brasil, as pesquisas envolvendo novas mídias têm se desenvolvido, mas
faltam estudos atuais sobre comunicação básica. Por isso, é preciso
equilibrar pesquisas sobre o novo e sobre o convencional”, disse.
Para
Marques de Melo, se por um lado houve aumento na quantidade de
pesquisas em comunicação na última década, com apoio crescente das
agências de fomento, por outro, ainda falta, por parte das instituições,
priorizar os estudos comunicacionais, pois o mapa de como a comunicação
se insere na sociedade ainda está por ser completado.
Marques de
Melo receberá no dia 24 de novembro, em Alagoas, a Medalha Denis Agra,
durante a cerimônia de entrega do Prêmio Braskem de Jornalismo.
Fonte: Agência Fapesp.
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