Superar o analfabetismo nas comunidades rurais no país ainda é um dos
principais desafios para os movimentos de trabalhadores do campo
brasileiro. A afirmação foi feita na terça-feira (21) pela integrante da
Via Campesina no Ceará, Maria de Jesus dos Santos, durante palestra no
segundo dia do Encontro Unitário dos Trabalhadores, Trabalhadoras e
Povos do Campo, das Águas e das Florestas, que terminou no dia 22
agosto, em Brasília.
Segundo Maria, que citou dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), dos cerca de 14 milhões de
analfabetos existentes no país, quase cinco milhões são camponeses.
“O
analfabetismo no Brasil não está presente entre os grandes
latifundiários, entre os comerciantes, os industriais ou os empresários,
mas entre os trabalhadores. É uma questão de classe e precisa ser nossa
grande prioridade. Nas comunidades onde o analfabetismo é forte, é mais
fácil haver manipulação, a organização é mais difícil e os
trabalhadores assumem uma postura de subalternos”, disse.
Maria
também defendeu uma maior participação dos movimentos camponeses na
formulação das políticas públicas de educação específicas para essa
parcela de brasileiros. “Não queremos ser só beneficiários ou
público-alvo, mas sujeitos nessas políticas”, acrescentou.
A
integrante da Via Campesina avalia que houve avanços nos últimos anos,
como o lançamento das Diretrizes Nacionais para a Educação Básica nas
Escolas do Campo, pelo Conselho Nacional de Educação, além da criação
das bases para a instituição da Política Nacional de Educação no Campo,
por meio de decreto presidencial, em 2010, mas criticou o conceito
adotado no Brasil de levar à área rural uma “escola assistencialista,
precária e associada aos interesses do latifúndio, sem reconhecer e
valorizar a localidade onde está inserida”.
“O projeto de educação
no campo deve ser enraizado nos interesses das organizações camponesas,
baseado na agricultura familiar e nos seus variados modos de vida. As
escolas indígenas têm que ter sua cultura, as quilombolas têm que ter
sua história, sua tradição, e as camponesas, os valores de seus
movimentos”, diz.
Divina Lopes, integrante do Movimento dos
Trabalhadores Sem Terra (MST) do Maranhão, que também participa do
encontro, disse que a formação dos professores que trabalham nas escolas
do campo precisa ser específica. Segundo ela, além de enfrentar
infraestrutura insuficiente em diversas unidades, os alunos, em muitos
casos, não têm os saberes e as experiências locais incluídos no processo
de ensino.
“Muitas escolas da zona rural na minha região ainda
são de pau a pique. Além disso, em muitas delas, as experiências
voltadas para o campo são deixadas de lado, o que compromete a
valorização da história e da experiência camponesa”, lamentou.
José
Wilson, secretário de Políticas Sociais da Confederação Nacional dos
Trabalhadores na Agricultura (Contag), disse que uma escola de qualidade
ajuda a fixar os trabalhadores no campo, permitindo que eles
identifiquem oportunidades e potencialidades.
“A escola que a
gente quer mantém o povo, inclusive o jovem, no campo, porque lhe
confere condições de promover seu próprio sustento, sua vida com
dignidade nesse espaço. Quando a educação dialoga com a realidade local,
as raízes, os hábitos, os saberes e as vivências que já existem em
determinada região, ela facilita o aprendizado e contribui para um
melhor desempenho das atividades no campo”, disse.
De acordo com o
representante da Contag, um exemplo seria a inclusão de técnicas de
convivência com a seca, como estratégias de captação de água da chuva e
plantio de espécies adaptadas ao clima nas escolas da região do
semiárido.
“Por isso, a educação no campo não pode ser pensada
universalmente, mas regionalmente, para que sejam levadas em
consideração as necessidades de cada lugar”, defendeu.
Fonte: Agência Brasil
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