Luiz Carlos de Freitas para Revista Nova Escola
Especialista critica a visão empresarial da Educação e comenta os rumos que a política educacional brasileira está tomando.
A recente divulgação do documento Pátria Educadora: A Qualificação do Ensino Básico como Obra de Construção Nacional reacendeu o debate sobre as concepções de ensino que deveriam nortear a rede pública. Preparado pela Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República (SAE), o texto - que ambiciona materializar o lema do segundo mandato da presidente Dilma Rousseff - traz orientações divergentes em relação ao Plano Nacional de Educação (PNE), aponta Luiz Carlos de Freitas, professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Na opinião do especialista, que há mais de 20 anos pesquisa avaliações e políticas públicas educacionais no país, a proposta é pautada por uma visão empresarial da Educação que desmoraliza os professores e aumenta a segregação escolar. Em entrevista a NOVA ESCOLA, Freitas detalha a crítica e comenta os rumos que a política educacional brasileira está tomando.
O documento da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) considera as discussões que têm ocorrido no campo da Educação?
LUIZ CARLOS DE FREITAS Não. O texto ignora todo o debate da Conferência Nacional de Educação (Conae), da mesma forma que o governo ignorou o próprio Ministério da Educação (MEC), remetendo a elaboração da política educacional para a SAE. Que ela participasse de um esforço conjunto com outras entidades seria compreensível, mas, ao chamar para si a liderança e a orientação da política educacional, ela exclui quem costumeiramente participa desses esforços.
O senhor afirma que o texto da SAE é pautado pela lógica empresarial. O que isso significa?
FREITAS Significa, por exemplo, imaginar que, se inserirmos as escolas públicas no mercado, a concorrência se instala e o "produto" melhora. Ou propor que o pagamento dos envolvidos passe a ser feito com base na produção. Isso não funcionou em nenhum lugar do mundo. Note: já foi experimentado à exaustão e não deu resultados significativos. Se você colocar um empresário para pensar a Educação, é natural que ele responda com os recursos teóricos que tem. Mas o debate sobre esse assunto exige profissionais específicos.
O texto defende um ensino baseado em "um modelo de desenvolvimento produtivista, capacitador e democratizante". Qual concepção de Educação está por trás dessa visão?
FREITAS Um dos grandes problemas das reformas educacionais contemporâneas, em especial dessas baseadas em princípios empresariais, é a ausência de discussão e definição do que entendemos por uma "boa Educação". A questão está extremamente distorcida, sendo vista como sinônimo de notas altas em testes. Não existe nada no campo das ciências da Educação que ampare tal crença. Do ponto de vista educativo, essa não pode ser a finalidade do ensino. Temos que ir muito além de tirar notas boas nessa ou naquela disciplina. Também não podemos nos resumir apenas à elaboração de uma base nacional curricular especificando uma lista de conteúdos. Precisamos ter um projeto educativo para a formação da nossa juventude como nação. A ênfase em provas cria concorrência e gera ganhadores e perdedores, o que não é compatível com os objetivos educacionais. Ao contrário do mercado, a Educação só deve ter ganhadores.
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